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Jorge Amado para um Historiador

Por Flávio Gonçalves dos Santos Universidade Estadual de Santa Cruz fgsantos@uesc.br

O que quero compartilhar com vocês é produto, menos de um sistemático estudo da obra de Amado e mais o resultado de minhas experiências utilizando seus romances, como uma valiosa fonte de informações nas pesquisas que desenvolvi até hoje. Minha comunicação com vocês não tem o objetivo, nem se sustentaria, como um receituário metodológico de “como se deve escrever a história a partir da obra de Jorge Amado – parafraseando um pouco o título de Von Martius, em sua tese para o IHGB.

Há dois aspectos da literatura em geral, e da amadiana particularmente – sobre os quais tecerei algumas ponderações: a) a capacidade que a literatura tem de retratar de forma multifacetadas questões fundamentais de seu contexto de produção e também de outros tempos e b) a capacidade que a literatura tem de interferir, melhor de construir a realidade, tanto como representação, quanto na motivação das pessoas e, porque não, do corpo social na buscar por alternativas distintas às vividas – que tentarei utilizar como balizadores de minha reflexão.

Podemos verificar esses fenômenos, por assim dizer, em A geração da Utopia, de Pepetela quando ele, através de Horácio nos diz:

Qual Camões, qual Pessoa, Drummond é que era, tudo estava nele, até a situação de Angola se podia inferir na sua poesia. Por isso vos digo, os portugueses passam a vida a querer-nos impingir sua poesia, temos de a estuda na escola, e escondem-nos os brasileiros, nossos irmãos, poetas e prosadores sublimes, relatando os nossos problemas e numa linguagem bem mais próxima do que falamos nas cidades (PEPETELA, 1992, p.31).

Num pequeno trecho de sessenta e sete palavras, múltiplas dimensões se revelam desse potencial da literatura. Revela-se aí, o controle ideológico de uma ordem dominante e colonizadora; a circulação atlântica de ideais estéticos e políticos; a universalidade da literatura na tradução dos sentimentos humanos, mas também deixa antever que a ordem está em disputa. Que há uma proposta, um projeto político de emancipação, manifesto na busca por uma linguagem distinta da hegemônica, e mais adequada a expressão da realidade e sentimentos dos que se rebelam.

Segundo Laila Brichta (2012), a razão da predileção dos intelectuais angolanos pela linguagem literária dos brasileiros reside no impacto da literatura modernista, em particular do romance regionalista, que retratava uma realidade muito próximas ao contexto das colônias portuguesa. Porém, ela era atrativa, também, pela opção que fez de trazer para suas páginas a cadência da oralidade nos diálogos entre seus personagens, como um registro vivo e etnográfico das realidades que retratava e pela forma como homens e mulheres expressavam-se diante da exploração do trabalho, das tensões em relação à posse da terra, ao exercício poder, ao autoritarismo e, sobretudo, pela da forma como expressavam seus sonhos e ambições. Como disse de Pepetela, através de Horácio: “relatando os nossos problemas e numa linguagem bem mais próxima do que falamos”.

Ana Paula Parlamarchuk (2014), chamou à atenção para o profundo envolvimento de intelectuais, como Graciliano Ramos, Carlos Drummond de Andrade, Jorge Amado e outros, expoentes do movimento modernistas com o PCB, que a partir dos anos de 1930 para além do projeto estético, assumem feições de um projeto político ideológico de emancipação popular. Segundo a autora:

Concomitantemente, há a valorização do “povo” e o tema do trabalhador rural aparece como um “problema social” integrando a engrenagem da estrutura fundiária. Na busca pelo desmascaramento, pela crítica às injustiças sociais e de conhecer a realidade nacional ainda não “descoberta, os escritores enfatizam o aspecto documentário do romance (PALARMARTCHUK, 2014, 94).

Então é justo concluir que essa literatura, da qual Jorge Amado é um importante expoente, possuía proposta objetiva tanto de retratar a realidade, quanto atuar concretamente sobre ela, e, que houve êxito na implementação desta agenda.

Agora, alguns de vocês podem me interpelar dizendo: – Huumm… interessante! Mas como um historiador se beneficia da literatura de Jorge Amado, por exemplo, se ela tem o compromisso com uma certa visão de mundo?

Outros de vocês podem também perguntar ou sugerir: – Então, se temos a literatura, para que precisamos da História?

Há quem veja na História e na Literatura o mesmo papel, ou ainda, que a História é um gênero literário bem comentado. Não posso dizer que concordo com isso, por outro lado, também não posso dizer que tenho grandes preocupações com o estatuto científico da História. Concebo, no entanto, que o fazer do literato e do historiador são distintos e, respondem a papéis e responsabilidades próprias, sem que haja aí uma mensuração de importância.

Um historiador é prisioneiro daquilo que consegue afirmar através de suas fontes. Dos cacos de realidade que consegue juntar e dar sentido em um mosaico. O literato, com o uso da licença poética, deve construir uma realidade alternativa a partir daquilo que ele conhece. No final, ambos são frutos do seu tempo, parafraseando Marc Bloch. Uma se valendo da outra, para construir explicações e alternativas para as questões próprias de seu tempo, compreendendo o melhor que podem como se articulam as grandes questões da humanidade.

Neste caso, um historiador como eu, interessado em compreender a realidade do Brasil, ou mais especificamente da Bahia, no século XX, encontrará nas páginas dos romances de Jorge Amado temas que estava em debate nos contextos de produção de cada romance.

Em o País, do Carnaval, por exemplo, temas como mestiçagem, pretensões políticas e a ascensão social de novos-ricos com aspirações intelectuais e hegemônicas são trazidas à baila. Elementos que aos folhear as páginas dos jornais da época estarão lá postas, nos discursos jornalísticos contra a miscigenação e as populações afro-brasileiras, nas matérias sobre a prosperidade das lavouras de cacau ou sobre o auspicioso ou não futuro da Bahia.

Em “Cacau” estão os anônimos que garantem a prosperidade da Bahia, definhados e esquecidos nas matas Sul baianas, sobrevivendo em regime de semiescravidão. Não são realidades inventadas, estão nos documentos oficiais, nos censos demográficos, mas iconografias, nos anuários estatísticos. Mas seus falares, em suas expressões, ditas em certa cadência de sua fala, suas crenças, seus valores, seus dramas podem ser inferidos, pela verossimilhança, quase etnográfica com que o autor as descreveu nas páginas do romance.

Em “Tenda dos Milagre”, estão expressas tanto o discurso racista, quanto as reações e rejeição a eles, que igualmente podem ser verificados em teses da Faculdade de Medicina, nos trabalhos acadêmicos Antropológicos e Etnográficos, que por deslise ou por concepção do autor, expressam visões da população baiana, que hoje consideramos inadmissíveis e absurdas. Mas também está a luta pela preservação da identidade e da cultura afro-brasileiras; as resistências às invasões aos terreiros de candomblé e as interpenetrações entre as culturas populares e eruditas.

Em “Gabriela; cravo e canela”, observa-se os debates entre as aspirações à modernidade, o conflito entre as elites uma agrária, decadente e outra emergente com aspirações de integração ao grande circuito comercial atlântico. Debates que se referiam a 1925. Sem dúvida! Mas que estavam tão acesos em 1968, quanto na época de ambientação do romance.

Em “Mar morto” estava o cotidiano de homens e mulheres da região portuária de Salvador, confrontados em suas poucas opções de viver com dignidade, sobretudo, as mulheres cujas opções variavam entre prostitui-se ou ir definhar nas fábricas da Península Itapagipana e cujo desfecho não poderiam ser mais magistral.

Todavia, embora todos esses elementos estejam presentes na obra de Jorge Amado, o historiador, como leitor profissional que é, para além do eventual deleite estético e estilístico, interpela essa literatura buscando exatamente as complexidades do autor, sua visão de mundo, sua posição social, sua agenda política. Ele interroga o contexto de produção da obra, articulando-a com a trajetória pessoal, literária e profissional do autor. Põe em diálogo os textos literários com outros registros da passagem humanas com seus dramas e tramas por aquele contexto histórico, tanto do retratado pela obra, quanto pelo contexto de produção da obra.

São exatamente esses procedimentos que permitem a um historiador, por exemplo, olhar as obras de ficção futurista e depreender delas, uma certa compreensão da sociedade e do contexto de sua produção. Hoje, nos deliciamos, por exemplo, com as visões de futuro e da ciência contida nos romances de Júlio Verne. E elas são tão reveladoras de sua própria época, como qualquer romance do século XIX, ambientado, no mesmo século XIX. Em ambos os casos, apresentam-se possibilidades de construção de relações alternativas às vividas, tanto de um ponto de vista otimista, quanto pessimistas. As utopias e distopias, como se diz…

Essas possibilidades de construção de realidades alternativas que a literatura apresenta são as que ao longo da história tem atuado no sentido de estimular a humanidade a rever, nem sempre de modo positivo ou sem consequências, seus padrões, valores e consensos sociais, que atuam sobre os processos históricos. Incontáveis são os registros de obras literárias que influenciaram fortemente processos que alteraram os rumos da história e, entre elas, seguramente estão as obras de Amado.

 Como conclusão, posso dizer que nas páginas dos romances de Jorge Amado encontram-se os principais temas debatidos pela sociedade brasileira e, particularmente baiana, do século XX. Ele foi grande e universal, porque seguindo os conselhos de Leon Tolstoi, falou de sua aldeia … a Bahia.

Referências AMADO, Jorge. País do Carnaval, Cacau, Suor. São Paulo: Editora Martins, 1974. ___________. Cacau. Rio de Janeiro: Record, 2000. ___________. Gabriela, cravo e canela: crônica de uma cidade do interior. São Paulo: Livraria Martins, 1971 ___________. Mar morto. Rio de Janeiro: Record, 1994.  ­­­­___________. Tenda dos Milagres. Rio de Janeiro: Record, 2001. BLOCH, Marc. Apologia da História ou o ofício de historiador. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2002 BRICHTA, Laila. “‘A bem da nação’: literatura, associativismo e educação no Brasil e em Angola, 1930-1961”. Tese de Doutorado. PPGH UNICAMP. 2012. PALAMARTCHUK, Ana Paula. Novos bárbaros. Escritores e Comunismo no Brasil 1928-1948. Maceió: EDUFAL, 2014. MARTIUS, Karl Friedrich Philipp Von. “Como se deve escrever a história do Brasil”. Revista do IHGB. Rio de janeiro 6 (24): 389-411. 1845. TOLSTÓI, L. Guerra e Paz. Belo Horizonte: Editora Itatiaia, 1983

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FLÁVIO GONÇALVES

Professor Titular do Departamento de Filosofia e Ciências Humanas da UESC Programa de Pós-Graduação em História: Atlântico e Diáspora Africana.

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